O Que é Realmente a Traição?

O Que é Realmente a Traição?

As pessoas falam muito de traição. Só existe uma traição: a de ti para ti. Só tu te consegues trair. Não há mais nenhum tipo de traição. Só esta é real. Só esta existe.

Mas normalmente, as pessoas associam a palavra traição a acontecimentos que não correspondem às suas expectativas. Por isso é que as traições ocorrem sempre com amigos e pessoas que nos são próximas. Apenas porque não criamos expectativas com desconhecidos, então não há possibilidade de traição.

Mesmo o conceito de traição muda de pessoa para pessoa. Porquê? Porque os conceitos, todo o tipo de conceitos, mudam consoante o ambiente onde crescemos e as crenças que fomos construindo. E é por isso que existem imensos tipos de traições. Pelo menos, as pessoas acreditam que sim. Como já disse, só existe verdadeiramente um tipo de traição. Ninguém te consegue abandonar. Só tu é que te podes abandonar.

Muitos associam traição a infidelidade, mas o que é realmente ser infiel? Alguém te trai, mas quem diz que isso é uma traição? Como podes definir traição? Existem muitos tipos de traições porque existem muitas interpretações. Cada pessoa interpreta o acontecimento à sua maneira. Até podes dizer que te traíram. Foste traído porque a tua mãe, o teu pai, o teu amigo ou o teu companheiro foram embora. Falharam contigo. Então, tu dizes que te traíram. Essa é apenas a tua interpretação. Talvez fosses uma pessoa muito crítica ou possessiva. Talvez tivesses sempre com ciúmes e até privasses o outro de ser livre. Talvez nem te amavas a ti próprio e querias amar o outro.

Numa relação amorosa, se há uma terceira pessoa é porque havia espaço suficiente para que aparecesse. Não é uma questão de culpados, mas ambos são igualmente responsáveis. Normalmente, as pessoas questionam-me como são responsáveis por algo que não escolheram. É um facto, ninguém escolhe ser traído. Pelo menos, não conscientemente. E é por isso que as pessoas sofrem, porque não desejavam tal coisa. As suas expectativas não foram correspondidas. Mas são sempre as nossas escolhas que determinam os acontecimentos da nossa vida. E nós estamos sempre a escolher. Não existe ausência de escolhas. Podem é não ser as melhores. Raramente o são, aliás.

Se analisarmos profundamente um relacionamento amoroso, compreendermos que ambos se influenciam. Positiva ou negativamente. A influência existe de igual forma em ambos, mesmo agindo de formas diferentes dentro da relação. Não há vítimas, nem há culpados. Mas se existir uma terceira pessoa no relacionamento, ele tem de morrer. De uma forma ou de outra, tem de morrer. Pois a presença de uma terceira pessoa significa que a relação era completamente desequilibrada. Ou a matam para a reviver, sabendo que reviver significa alterar ou a matam e seguem caminhos separados. Reviver um relacionamento é bem mais difícil do que o terminar.

Se tu cultivares um sólido relacionamento contigo e fores absolutamente fiel a ti, irás sempre encontrar um parceiro de vida, um companheiro de caminhada com quem possas crescer e voar. Isto porque ao investires em ti, as expectativas morrem. Não há lugar para elas. Tu és livre e permites que os outros o sejam. Compreendes então que só tu te podes trair. Só tu és responsável pela tua vida. Ninguém está cá para preencher ninguém. Ninguém está cá para satisfazer as tuas expectativas ou suprimir as tuas vontades. Desejá-lo é egoísmo. Só relacionamentos reais valem a pena. E esses só existem quando há amor-próprio, pois onde há amor-próprio não há apego. E o apego destrói, sufoca e mata.

Muitos não conseguem conviver consigo mesmos e desejam conviver com o outro. Como queremos que as coisas corram bem?! E das duas uma: ou começamos a sufocar o outro ou somos sufocados. Normalmente é uma dança, não conseguimos fazer os dois ao mesmo tempo. Se começarmos a sufocar o outro tornámo-nos insensíveis, frios e distantes. Se formos sufocados, começamos a nutrir raiva pelo outro, afinal é ele que nos prende e sufoca. É ele o motivo da dor. E adivinha? O amor deixou de ter espaço para germinar. Toda a tua vida começa a ser somente raiva, insensibilidade, dor, tristeza, agressividade…

Se te sentires preso, está na hora de te libertares. E só tu te podes libertar. Segue caminho e não olhes sequer para trás. Não esperes. Não cries ilusões. Não te agarres às expectativas. Se não conseguires ser tu onde estás, é porque não estás no sítio certo. Está na hora de conhecer novos lugares e apreciar novas paisagens. A vida está repleta de novas oportunidades e experiências. Se permaneceres onde dói, se escolheres ficar onde não és feliz: então há traição. Estás a trair-te.

Viver é mudar. Os relacionamentos não são excessão. Até podia haver amor no início e foi-se perdendo. Há quem diga que o amor não morre, mas tudo o que nasce pode morrer. Tudo o que aparece pode desaparecer. Tudo o que chega pode ir embora. Tudo o que começa pode acabar. É a vida a ser a vida. Contrariar estes movimentos naturais é trair o próprio ser. É compactuar com um mundo infeliz e vazio.

Há relacionamentos que se mantém apenas por dinheiro. Já não há amor, nem carinho, nem confiança, mas não há condições para mudar. Na maioria das vezes, é a mulher que fica financeiramente dependente do homem. Mas é preferível continuarem juntos do que saltar para o desconhecido. Aqui está muito mau, mas pelo menos conheço — pensam. Tudo o que há é conflito e ressentimento, mas pelo menos não precisam de se reinventar. E vão permanecendo num falso relacionamento, que apenas se mantém por medo. Medo de voar. Medo de mudar. Medo de viver. E muitas pessoas escolhem ser pais enquanto vivem este tipo de relação. Não se contentam em destruirem-se a si mesmos, também destroem as gerações futuras. O que está a acontecer à nossa sociedade?

E o que acontece aos que têm coragem de ir? De largar tudo e voar? Muitas vezes são vistos como traidores. Tudo devido às interpretações. Nós não vemos a vida como é, vemos como somos. E é aí que está o desequilíbrio. Lá no fundo, aqueles que se libertaram não são traidores, pois deixaram de se trair.

Que a principal lealdade que cultives seja contigo, só assim ela estará presente em todo o lado. Só assim terminarão as traições. Da lealdade surgirá a confiança e a confiança consiste em aceitar o outro tal como é, sem expectativas. Confiar não é controlar, é libertar. E só aquele que é livre pode respirar e entregar liberdade.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *